Amar se aprende amando

Por Juliana dos Santos Soares

08/05/2020

 

Esse texto é uma continuação de “Encontrar alguém não é a nossa maior questão amorosa”, e por isso recomendo a leitura, antes de começar esse aqui. Ali, começamos a olhar para a ideia de que a grande questão sobre ser feliz no amor não consiste em “encontrar alguém”, mas em amar, de fato. Trouxemos contribuições de Erich Fromm para o tema, em seu livro “A arte de amar”. Ele diz que amar é uma arte, e como arte pode ser aprimorada através de um domínio da teoria e de prática insistente.

Conhecer a “parte teórica” do amor implica em buscar entendê-lo melhor. É considerar os estudos sobre o tema como uma possível fonte de inspiração, refletir sobre o assunto, trocar ideias com outras pessoas também interessadas, arejar nossas crenças o amor, indo além dos pontos de vista que criamos na nossa vivência, avaliando nossas frustrações e buscando compreender melhor o amor em nossas vidas.

A prática do amor

Mas e praticar? Seria ter um grande número de relacionamentos, até encontrar satisfação? Como somos seres em relação e em busca de vínculos, uma tendência natural é essa mesmo, mas corremos o risco de cair na velha armadilha de buscar “o tal alguém” que irá “nos salvar da solidão” em cada encontro. Prestando atenção nisso, sugiro olharmos para alguns pontos importantes, que podem nos guiar na busca por amar de forma mais madura. São elementos que Erich Fromm aponta como básicos e presentes em todas as formas de amor, e que podem orientar nossa vida amorosa:

  • Disponibilidade para dar de si: O amor “é um ‘manter-se ligado’, não é uma simples ‘queda’. De um modo geral, o caráter ativo do amor pode ser descrito afirmando-se que amar é principalmente dar, e não receber” (Fromm, 2015, p. 28). Eu já escrevi um pouco sobre isso nesse texto aqui e nesse aqui.
  • Cuidado e responsabilidade, entendidos como atenção e zelo pelo bem-estar da outra pessoa. Aqui, temos que pensar com mais profundidade: nossas principais referências de cuidado costumam ser o que uma mãe (ou pais) tem pelo/a filho/a, e não é esse o tipo de cuidado saudável numa relação entre pessoas adultas. Esse tema é muito importante, e ainda o abordarei melhor em outro texto, em breve.
  • Desejo de conhecer o outro: abertura para ver a outra pessoa como ela é, conhecê-la. Quando estamos apaixonadas/os por alguém, o que mais acontece é vermos essa pessoa através das lentes do que desejamos no amor, esperando que ela atenda nossas expectativas (que às vezes são conscientes e às vezes não). Aqui vou chamar outro teórico, J. L. Moreno, pai do Psicodrama, que nos apresenta o conceito de Tele, um fator fundamental das relações interpessoais sadias e que “repousa no sentimento e conhecimento da situação real das outras pessoas” (Moreno, 1999, p. 45). É estar presente no aqui-e-agora da relação, em contraponto a projetar coisas de outro tempo e lugar. Desenvolver o fator Tele demanda muito conhecimento de si mesmo, para discernir as próprias aspirações, condicionamentos e expectativas e, junto com isso, abertura para conhecer o outro.
  • Respeito: Além de ver a outra pessoa como ela é, é ter consciência de sua individualidade, alimentando um desejo de que ela cresça e se desenvolva para o seu próprio bem, e não para servir à relação e aos interesses da outra pessoa (eu, que a amo). Segundo Erich Fromm, “o respeito só é possível se eu for independente; se eu puder ficar de pé e andar sem precisar de muletas, sem ter de dominar e explorar ninguém. O respeito só existe com base na liberdade”. (Fromm, 2015, p.35)

Quanta coisa, né? Amar se mostra como algo muito mais complexo do que se sentir bem ao lado de alguém. É uma experiência e atitude central na nossa vida, estando ou não em um relacionamento afetivo-sexual. Não é um lugar de descanso a que chegamos depois de uma longa busca. A real busca, aquela que considero que vale a pena na nossa vida, é a pelo amor em si. Ou, correndo o risco de ser um pouco clichê, o amor é o caminho e não o destino!

Desejo, para todas e todas nós, um caminho cheio de alegria e vida, e que o trilhemos com coragem e inteireza!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Fromm, E. A arte de amar. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2015.

Moreno, J. L. Psicoterapia de grupo e psicodrama. São Paulo: Editora Livro Pleno, 1999.

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