Sobre a felicidade

Por Juliana dos Santos Soares

22/06/2011

A resposta de qualquer pai ou mãe, questionado sobre o que deseja para os filhos, está sempre na ponta da língua: “Só quero que sejam felizes”. A frase não deixa dúvidas de que, numa sociedade moderna, livre de muitas das restrições morais e culturais do passado, a felicidade é vista como a maior realização de um indivíduo. Até governos nacionais se viram na obrigação de fazer algo a respeito. Neste ano, a China e o Reino Unido anunciaram a intenção de medir o grau de felicidade de seus habitantes. Os governantes, espera-se, querem o melhor para seu país, assim como os pais querem o melhor para seus filhos. Mas a ambição de sempre colocar um sorriso no rosto pode ter um efeito contrário. A pressão por ser feliz, condição nada fácil de ser definida, pode acabar reduzindo as chances de as pessoas viverem bem.

Assim começa a matéria de capa da revista Época de 21/05/2011, “O mito da felicidade” (edição 679) que relativiza a importância do que chamamos felicidade para vivermos bem. Não por acaso, na mesma semana em que li a reportagem participei de um trabalho terapêutico muito significativo no curso de formação em Gestalt-terapia*, cujo tema era entrar em contato com a dor e, a partir dela, com a alegria. Como a Flor de Lótus, que nasce na escuridão do lodo e cresce para a superfície da água, podemos transformar a experiência da dor em parte do nosso crescimento e iluminação.

Flor de lótus

Estamos sempre em busca das condições ideais para sermos felizes. Contamos com várias receitas para estar mais belos, mais inteligentes, mais qualificados. Em um mundo em constantes transformações como o nosso essas receitas se atualizam a cada dia, novos desejos e necessidades são criados por nós e para nós constantemente. E a busca continua…

Nosso mundo interno também vive em oscilações. A cada dia estamos com um estado de humor diferente, que muitas vezes varia de acordo com o que ocorre no nosso entorno. Acreditamos só viver a felicidade quando experimentamos prazer, com nossas necessidades e desejos atendidos. É como canta Lulu Santos em Condição: “Eu me viro bem melhor quando tá mais pra bom que pra ruim”… O problema com isso é que ficamos reféns do que ocorre ao nosso redor para nos sentirmos bem. E nem sempre encontramos essas condições para a felicidade em nossas vidas.

Um aprendizado constante para mim é que esse bem-estar pode ser mais integralmente alcançado quando conseguimos ficar conosco e com tudo o que temos, numa atitude de aceitação do que somos. É o autoconhecimento – tarefa da Psicoterapia. Porém, em meio a tantos estímulos e ofertas de felicidade é difícil parar por alguns momentos e suportar o silêncio de estar só consigo, conhecer quem é essa pessoa do outro lado do espelho. Nos ver sem máscaras é uma experiência por vezes dolorosa.

A experiência de estar consigo não acontece necessariamente num ambiente como esse. Trata-se de um estado de recolhimento interno

Muito recentemente uma cliente entrava em contato com sua ansiedade na sessão de Psicoterapia. Em meio à angústia de se deparar com algo desagradável ela disse algo belíssimo: “Isso que vejo em mim é como uma nuvem negra que me acompanha. Ela me atrapalha, mas também me ajuda… Fico feliz por vê-la, pois assim posso lidar melhor com ela e comigo”.

A reportagem citada diz que ”as emoções negativas, embora desagradáveis, podem servir de alerta para o indivíduo de que há um problema que precisa ser resolvido ou prepará-lo para experiências futuras”. Concordo e vou além: acredito na importância do crescimento com a dificuldade e a dor. Significa mais do que sobreviver a elas, é saber da própria força, se conhecer melhor e seguir adiante.

Isso pra mim é felicidade: Saber “a dor e a delícia de ser o que (se) é”.

*Agradeço a Pedro Ramos e aos queridos colegas Inspiraldos pela experiência e reflexões.

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