Por Juliana dos Santos Soares
23/11/2017
Qual é a imagem que você tem de si mesmo/a? Se tivesse que se apresentar a outra pessoa, como se descreveria? Que características ressaltaria? E que aspectos da sua história de vida estariam mais presentes em sua narrativa?
Nossa autoimagem é contruída ao longo da nossa história. Primeiro, a partir daquilo que escutamos sobre nós, nomeado pelas pessoas importantes da nossa vida. Aos poucos, nos apropriamos dessa história e passamos a contá-la, por nossa conta e do nosso jeito. Sempre privilegiando alguns aspectos e negligenciando outros. Hoje escrevo sobre nossa história e autoestima, e trago a contribuição, para mim importantíssima, da Chimamanda Adichie. Ela é escritora e, portanto, contadora de histórias. Nessa fala sua para o TED, em 2009, ela expõe sobre o perigo das histórias únicas.
Aperte o play, ative as legendas em português e vamos ouvi-la.
Aqui eu destaco alguns pontos da sua fala, para em seguida fazer um diálogo mais voltado para a Psicologia:
- Somos muito impressionáveis e vulneráveis frente a uma história, especialmente quando somos crianças.
- Como se cria uma única história: Mostre um povo como uma coisa, e somente uma coisa, repetidamente, e isso será o que eles se tornarão.
- Todas as histórias da minha vida fazem-me ser quem eu sou. Insistir apenas nas histórias negativas é superficializar minha experiência e negligenciar as muitas outras histórias que me formaram.
- A história única cria estereótipos. O problema com estereótipos não é que eles sejam mentira. Mas eles são incompletos; fazem uma história tornar-se a única história.
- A consequência da história única é que ela rouba das pessoas a sua dignidade. Dificulta o reconhecimento da nossa humanidade compartilhada. Enfatiza o quanto somos diferentes, ao invés de como somos semelhantes. Portanto, dificulta a conexão.
Um olhar psicológico
A fala da Chimamanda tem um viés social, amplo. Mas, como isso se relaciona com a nossa vida como indivíduos e em nossas relações mais estreitas?
Somos constituídos/as de múltiplas histórias, com diferentes nuances, cores, alegrias e dramas. Passamos por diversos momentos e ciclos de vida, desempenhamos vários papéis, em diferentes relações destacam-se características diferentes de quem somos… Somos complexos! Mas temos (muitos de nós) o hábito de nos definirmos como uma coisa só. “Sou introvertida”; “sou generoso”; “sou egoísta”; “sou festeira”…
Jacob Levy Moreno, o pai do Psicodrama e da Psicoterapia de grupo, cunhou o conceito de conserva cultural referindo-se à repetição de padrões na nossa vida – a incapacidade (ou dificuldade) de dar uma resposta nova (e mais adequada) a uma situação. Normalmente, quando falamos dessas conservas, referimo-nos a comportamentos, mas vale também para visões de mundo, percepções da vida e de quem somos. Quando contamos a nossa história de uma única maneira, quando nos definimos de uma única forma, estamos conservados/as. Sem saúde na nossa relação conosco e como o mundo.
A alternativa saudável à conserva cultural apresentada por Moreno é a Espontaneidade: a capacidade de ir além, de explorar novas respostas, mais felizes, numa situação experimentada. Com relação à nossa história,a proposta é mais ou menos esta:
- E se você conseguisse ver a sua própria história de outro ângulo? Como se estivesse sendo contada por outro narrador? Dando destaque a aspectos dela que são negligenciados até hoje?
- E se conseguisse ver o valor que tem, mesmo vendo as suas dificuldades e imperfeições?
- E se, ao se deparar com partes dolorosas da sua vida, pelas quais você costuma chorar, pudesse ver o seu potencial de superação – ver as suas lutas e vitórias?
- E se você conseguisse, vendo seu pior lado, se tratar com um pouco mais de gentileza?
Que diferença isso faria na sua vida?
Finalizo essa reflexão citando, novamente, uma fala da Chimamanda Adichie: “Quando nós rejeitamos uma única história,quando percebemos que nunca há apenas uma história sobre nenhum lugar (e, acrescento, sobre nenhuma pessoa), nós reconquistamos um tipo de paraíso”.