Autoconceito e integração de polaridades

Por Juliana dos Santos Soares

24/08/2018

 

Nós somos seres complexos. Por vezes, buscamos nos compreender e nos definir de forma simples, com afirmações do tipo: “Sou segura/o”; “Sou tranquila/o”; “Sou ansiosa/o” e por aí vai. Mas essas definições acabam perdendo o sentido, e causando confusão, quando nos mostramos de forma oposta ao nosso autoconceito. A confusão muitas vezes vem acompanhada de uma tendência a esconder ou negar o comportamento ou sentimento. Mas isso tudo é normal, e faz parte de um tema muito estudado e trabalhado na Gestalt-terapia: as polaridades.

Para essa abordagem da Psicologia, cada indivíduo é um conglomerado de forças polares que se entrecruzam. Assim, temos em cada um de nós, por exemplo: a beleza e a feiura, a razão e a emoção, a força e a fragilidade, a ternura e a dureza… Tudo isso faz parte de quem somos, e não necessariamente há incompatibilidade entre esses opostos. Nós é que os julgamos incompatíveis, porque temos muito mais simpatia por algumas dessas características e antipatia por outras. E essas de que não gostamos, nós queremos negar, excluir do nosso autoconceito. Dessa forma, alimentamos uma autoimagem incompleta e, portanto, falsa.

Mas o fato de não gostarmos de algumas de nossas qualidades não faz com que elas deixem de existir.  E é aí que nasce uma boa parte de nossos conflitos. Gastamos uma energia imensa para sermos aquilo que aceitamos ser, de forma absoluta. Por exemplo: Se uma pessoa se reconhece como disponível para as outras pessoas, e não aceita a possibilidade de estar indisponível, porque julga essa qualidade de maneira negativa, ela fará um grande esforço para estar sempre disponível, quando de fato está e mesmo quando não está. A indisponibilidade que reside nela não terá um lugar legítimo para se manifestar, mas continuará existindo. Assim, há grandes chances dessa pessoa se apresentar disponível para as outras, mas se remoendo por dentro. E, provavelmente, quando se deparar com alguém que manifesta a indisponibilidade, isso a incomodará, por “cutucar” uma parte sua que ela luta para esconder.

A pessoa saudável, nessa dinâmica de forças, é aquela que está consciente da maioria de suas polaridades (inclusive daqueles pensamentos e sentimentos que ela mesma ou a sociedade condena), e que é capaz de se aceitar assim. Mais uma vez caímos no tema da aceitação de si mesmo/a, e mais uma vez eu digo: aceitar todas as suas qualidades não significa aprová-las. Significa ter consciência de que aquilo faz parte de si, encarar-se como se é e seguir adiante, sem negar. E isso é sinal de força interior.

O trabalho de integração de polaridades

O trabalho de integração de polaridades visa a ajudar a pessoa a se olhar de forma mais inteira, a “desviciar” a imagem que tem de si mesma. A se reconhecer naquelas partes com as quais mais se identifica e naquelas a que resiste. Olhar para essas partes negadas normalmente gera ansiedade, então um bom manejo terapêutico é muito importante. Com as polaridades reconhecidas, o próximo passo é aprofundar no seu conhecimento, observar como elas atuam no funcionamento do indivíduo, como se relacionam… Como se fossem duas pessoas diferentes, que habitualmente estão em conflito, mas agora resolvem se conhecer melhor, para tentar entrar num acordo.

Ampliar essa visão de si mesma/o permite que a pessoa aja de maneira menos estereotipada, melhorando o seu repertório de respostas frente a situações desafiadoras da vida, vivendo de forma mais inteira. E aqui o conceito de polaridades, próprio da Gestalt-terapia, se encontra com o de Espontaneidade, próprio do Psicodrama: A capacidade de dar uma resposta adequada a uma nova situação ou uma nova (e adequada) resposta a uma situação antiga.

Não só os conceitos se encontram, mas as formas de trabalhar das duas abordagens também se parecem e podem se complementar: tanto a Gestalt-terapia, com seus exercícios, quanto o Psicodrama, com suas técnicas e métodos, propõem trabalhos de ação e criatividade, que se mostram muito eficientes nesse tipo de questão, quando comparados às intervenções puramente verbais.

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